Por primeiro, se adonam de nós, espantados meninos a procurar a mão do pai, entre as cadeiras e a multidão em desordem, e um casto cheiro de serragem. Depois, são nossos filhos e a mesma cena, embora já tenha caído o pano para alguns personagens além dos palcos.
Chegam sem pedir licença, de mansinho, pé ante pé, e se instalam na primeira fila do coração da gente, como aquelas mulheres de começo de verão e seus coloridos vestidos, alheias e insensíveis aos sentimentos que provocam. Há de ser sempre assim com esses mágicos saltimbancos, que comandam, de um posto avançado das emoções, tanto o riso que brota da inocente boca desdentada como a lágrima que insiste em serpentear por entre os sulcos de uma face sofrida.
Pouco importa o descosido das lonas. De nada vale se a maçã não tem o mesmo gosto de outros amores, pois também estes já se fizeram rugas. E o palhaço! Ah! o palhaço da cara pintada e o sapato comprido, de bico arrebitado. Ladrão dos sonhos dormidos à sombra das velhas casas, e de um pensamento perdido não sei em que longínquos cenários.
Resta agora fitar, num canto do camarim, o retrato da bailarina que se foi. Como poderia supor que o amor perece, torna-se lasso, devasso, às vezes, depois de suas tantas juras. Palhaço de mim, nunca irão perceber tua dor, disfarçada de cambalhota. Sobrará de ti a saudade da ribalta a iluminar alguém que “ficou para sempre com este ar de guri desconsolado, a olhar o terreno baldio, donde o circo partiu um dia antes”.
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