Carlos Augusto Ramos Jardim é o nome completo da fera. Daí para Kako foi um abraço, como acontece a todos os nascidos e batizados Carlos e depois chamados de Kako até o dia de baterem continência para São Pedro na porta sem tramela do etéreo. Bigodinho três por quatro, do tipo galã de circo pobre, foi-me apresentado através de um cupincha comum, a mais pura delicadeza em pessoa, que atende pela alcunha de Cavallo. É contraparente em terceiro grau, fiquei sabendo ontem, do Martelinho “Boca de Jarra”.
Pois logo que a crista de galinho fino veio a furo, o Kako tratou de abrir os trabalhos conforme mandava o figurino e a lei da cantoria. Primeiro, foi uma prima, torta de tão boa, que ele passou em armas numa festa na capela lá no São Rafael. Depois, uma cunhada menos precavida mergulhou com pouca roupa na banha quente, na segunda noite de Carnaval, ao som de “mas que calor, oh,oh,oh,oh,oh,oh”.
Varada a fase de atracagem nas parentas desavisadas, pendeu rumo à Capital em busca de colocação no mercado da serventia humana. Paleteando o andor de Nossa Senhora no romeirismo dos Navegantes, logrou minudências de veludo com mocinha recatada, filha de família apetitosa das doutrinâncias de Cristo Nosso Senhor. Num 20 de setembro, já de namoro transitado em julgado com a religiosa, palpitou ao Kakinho uma volteada pelo Parque da Harmonia. Fraco o movimento do povo de saia, ele e um tio, falhado e quizilento, se mandaram para o Clube da Saudade. Esse tio, por sinal, não era muito chegado ao cloro. Peido de urubu fedia menos que ele. Perguntado, certa ocasião, sobre a frequência com que o H20 lhe percorria o fio do lombo, disse que um banho de açude bem tomado, na minguante, e não tendo que “lidá com oveia”, durava com folga uns 15 dias…
Mas voltando ao meu amigo. Entrado no telereio com uma atipada morena, descoberta em meio à extrema-unção da festa pagã, tratou de vereda de dar o número do seu telefone celular. Final de noite, era um tal de telefona-pra-mim-que-eu-telefono-pra-ti de sair língua de fogo da campainha da goela. Passados alguns dias, a namorada oficial, guria aparentada com os princípios do Evangelho, mas desconfiada que nem cego cortando o cabelo, começou a bisbilhotar o celular do pretendente. Lá pelo meio da investigação, encontra a seguinte mensagem: “amor, não esquecerei tão cedo aquela noite caliente. Beijos demorados, dos nossos, da tua agora eterna Marga”.
Pra que foi! Instalado o Conselho de Sentença, composto somente pela caninana da sogra, réptil peçonhento de espécie ainda não catalogada no Instituto Butantã, apesar do crucifixo que trazia a meia espalda, teve início o interrogatório. O réu partiu, primeiro, para a negativa de autoria. Como viu a esfarrapada tese defensiva espatifar-se diante do torpedinho arquivado no visor do celular, tentou sair pelo lado do sobrenatural, alegando que estava possuído, do primeiro ao quinto, pelo Caboclo Pena de Jacu quando se deu o infausto sucedido. Também não vingou o argumento assombroso. Foi sentenciado à escalagem do perau, superfície dominada por galhos secos pontiagudos e espinhos de juá em quantia. O Kako passou mais de ano atracado com a pirambeira, peito escalavrado que nem parede de cadeia, num eclipse carnal de dar inveja a inquilino de mosteiro.
No campo floreado dos assuntos de lençóis, uma teoria me zumbe as ideias que nem a mosca da vareja. Quando o sujeito se acha por cima da carne seca, futebol, carteado e confraria de segunda a quinta, com pescaria sagrada na sexta e bocha no domingo à tardinha, pode saber que é grande o risco de levar uma bola nas costas. A mulher de hoje, acicatada em seu brio pelo pérfido desprezo sentimental do parceiro que jurou amor eterno, não procura mais cantos e ombros para prantear a sua solidão. Sai de casa em silêncio, na maciota, sandalinha prateada com solado de pelica, à cata de vingança, e a maior delas consiste justamente em mostrar ao malfeitor da delicada alma feminina toda a inclinação do perau…
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