A medalha da Carla Fachin
Nesta reta final do período eleitoral, relembro de todas as promessas que fiz e encontro algumas que, mesmo querendo, não conseguirei cumprir. Aliás, as campanhas políticas sempre deixam saudades, pela renovação da esperança em dias melhores, geralmente nunca completamente alcançados e pela rivalidade saudável entre pessoas que pensam diferente. Sempre gostei do clima da política, embora me decepcione na maioria das vezes.
Mas a desolação desta reta final misturou-se com um fato enormemente mais triste, que foi o falecimento do Tio Cunha, meu colega de jornal e de comentários eleitorais. Embora já madurão, ele não parecia estar tão na capa da gaita que o levasse a óbito assim, sem que a gente se preparasse para grandes homenagens. Na verdade, o Tio Cunha é de uma geração que não envelhece, pois traz na ponta da língua um passado misturado com presente que é uma joia, existente somente nas pequenas cidades do interior.
Eram inúmeros os grupos sociais em que o Tio Cunha atuava e a mim tocavam dois: o bloco de carnaval Canela de Zebu e a imprensa escrita. Mas ainda tinha a política, o banco da fofoca na praça e principalmente o futebol. Ele foi de jogador a treinador, passando por cartola e terminando como placar. Nem o Humberto Stoduto conseguiu desempregar o Tio Cunha da contagem de gols, pois os desportistas sepeenses renderam-lhe belíssima referência alcunhando o placar eletrônico do ginásio municipal com seu nome, em um caso inédito e espirituoso de homenagem.
O degas aqui, que emocionado escreve estas frases remexido pela emoção e pela saudade, ganhou dezenas de medalhas do Tio Cunha, às vezes pelo que escrevi no jornal, às vezes pelo que deixei de escrever. Recebi uma pelo bloco Sai da Frente e outra em nome do Olímpia, além daquela depois do desfile da Semana Farroupilha. A última vez que o vi, meses atrás, prometi resolver um problema logístico que o impossibilitava de homenagear a jornalista sepeense Carla Fachim, que mora em Porto Alegre e não tem vindo muito a São Sepé. Ele me entregou uma medalha, enrolada em um papel com a frase “para a artista sepeense Carla Fachim”, na certeza que o brinde chegaria à destinatária.
Revelo agora, constrangido, que não cumpri esta promessa. Até tentei, sem sucesso, contatar Carla pelas redes sociais. Para o Tio Cunha, estava tudo resolvido. Agora carrego no bolso a medalha, como uma espécie de talismã, torcendo para que encontre a destinatária da homenagem pelas esquinas inseguras da capital e liberte-me deste compromisso, aumentado agora pelo passamento do Tio Cunha.
Talvez pelo meu histórico de insucessos eleitorais, sempre acho triste esta reta final da campanha política. No pleito de 2018, a tristeza tem um gosto de decepção comigo mesmo. Se minha mãe estiver certa – e eu errado – há um lugar no céu onde todo mundo se reencontra. Espero que quando chegar lá para ver o Tio Cunha eu seja um sujeito melhor e já tenha conseguido pagar esta e outras promessas, pelo menos para honrar todas as medalhas que ele me deu.
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