Prova do copo

Colunistas Geral

Encontrei dentro de um dos livros que compõem a coleção de Direito Civil Interpretado, do grande jurista Carvalho Santos, um artigo do meu pai sobre a tal prova do copo. Bem interessante, escrito no século passado. Falava ele, para começo de conversa, sobre a tal liberdade de crença, o que nunca foi nenhuma novidade. Hoje o artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, ratifica ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.
Segundo o Afif, a gente pode ser católica, pode ser demasiado protestante, budista inveterado, ruminante, vegano, tribalista e a ninguém é dado o direito de impugnar a escolha do Deus que der na telha da pessoa adotar como timoneiro. Nenhuma pessoa, importante ou desqualificada, letrada ou analfabeta, tem o direito de censurar a minha convicção religiosa, nem a mim, tampouco, assiste o direito de criticar a seita alheia.
Dito isso, no terreno de pormenores, a tal “prova do copo”, mandinga que recentemente emergiu das profundezas do esquecimento, voltou a bater orelha com as oferendas, macumbas, despachos e adjacências.
Pergunta o meu velho no tal escrito, entre outras indagações: sabeis o que é a prova do copo, percuciente leitor? Pois lá vai, digo eu: é um passatempo que voltou a virar moda, que nem o retorno do bilboquê e a bombacha de favo. Seguinte: o penitente traça o abecedário sobre uma mesa, em forma de círculo, e põe o dedo indicador no copo, que fica entre o abecedário. Aí os espíritos descem em bando das alturas celestiais, tipo Divisão Panzer do exército da Alemanha nazista, e impulsionam o copo em direção desta ou daquela letra, conforme for o destino vindouro do curioso em volta da bancada.
As solteironas bigodudas e atormentadas já se agarraram à prova do copo como o derradeiro galho de esperança, ansiosas por saber se ainda poderão casar na igreja como manda o figurino e a lei da cantoria, e se ainda existe neste mundo depreciado e confuso uma benevolente criatura capaz de abafar os seus suspiros suplicantes.
A velhota reumática e desconfiada também muito apreciou o novo método de adivinhação e teima em saber, por intermédio do copo, se a neta vai ou não juntar os trapos com o moço domador que está estudando veterinária na Bolívia.
O madurão agricultor tabagista e borracho também apela para o copo, tentando saber se a safra será farta e se o preço da saca do feijão miúdo plantado no cedo continuará a subir até as grimpas na Bolsa de Grãos e Tubérculos da Colônia da Aroeira.
O burocrata empedernido, o militar reformado, o doutor em unha encravada, o alambrador sem serviço, o presidiário tuberculoso, tudo se agarra no copo, querendo decifrar o porvir.
Ó Madalena, conceituada batuqueira do Rincão do Funcho, eu quero saber uma coisa muito séria e muito urgente. E a senhora, que faz a prova do copo, me responderá ao pé da letra e sem rodeio.
Eu não quero saber, ó Madalena, se caminho a passos largos para mais uma separação ou se seguirei atacado do peito até a entrada da minguante.
Eu quero saber com urgência, ó conceituada, ó suave, ó simpática, ó lírica Madalena, se serão cumpridas aquelas promessas de políticos profissionais que foram para frente da televisão pedir votos na última eleição ou foi apenas mais um cineminha de empulhação???

 3,718 Visualizações,  13 Hoje

Compartilhe

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *